segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Um esquema de XXX Cantos (1930) - Ezra Pound

CANTO XVII


Assim as vinhas se despencam de meus dedos

E as abelhas pesadas de pólen

Deslocam-se lentas pelos rebentos do vinhal:

       chirr – chirr – chir-rikk – um som felino,

E os pássaros sonolentos nos galhos.

      ZAGREUS! IO ZAGREUS!

Com o claro-pálido nascente do céu

E as cidades engastadas nas colinas,

E a deusa dos belos joelhos

Movendo-se lá, com o bosque de carvalhos ao fundo,

A verde escarpa, com os sabujos brancos

                        saltando junto dela;

E dali abaixo à boca da enseada, até a noite,

Água plana em minha frente

      e as árvores crescendo n’água,

Troncos de mármore gerados na quietude,

No passado os palazzi,

                                     na quietude,

A luz agora, não do sol,

                                   Chrysophrase,

E a água verde-claro e azul-claro;

Acima, para os grandes penhascos de âmbar.

                                                                        Entre eles,

Gruta de Nerea,

       ela, como enorme concha curva,

E o bote arrastado sem ruído,

Sem odor de singradura,

Nem grito de ave, nem qualquer rumor de vaga,

Nem salpico de porco-marinho, nem qualquer rumo de vaga,

Dentro de sua gruta, Nerea,

                                           ela, como enorme concha curva

Na suavidade do rochedo,

                                          penhasco cinza ao longe,

Perto, os pórticos de âmbar escarpados,

E a vaga,

                                         verde-claro e azul-claro,

E a gruta de branco salino e cintilante púrpura,

                               fria, pórfiro polido,

                               a rocha roída pelo mar.

Nenhum grito de gaivota, nenhum ruído de porco-marinho,

Areia malva, e nenhuma frieza por lá,

                           a luz sem ser do sol.

Zagreus, apascentando suas panteras,

       a gleba clara como nas colinas luminosas.

E, sob as amendoeiras, deuses,

                         com eles, choros nympharum. Deuses,

Hermes e Atena,

                            Como agulha de bússola,

Entre eles tremulou –

Para a esquerda fica o sítio dos faunos,

                           sylva nympharum;

A mata densa, o tosco bosque,

              a corça, o pequeno cervo malhado,

              saltam pelos arbustos em riste,

                            como folha seca na amarelo.

E, por um atalho nas colinas,

                    A grande aleia de Memnons.

Além, mar, crinas divisadas sobre as dunas

Mar noturno agitando cascalhos,

Para a esquerda, a aleia de cipreste.

                                                         Veio um barco,

Um homem sustentando sua vela,

Conduzindo-o com remo preso às falcas, dizendo:

“Lá, na floresta de mármore,

       as árvores de pedra – emersas d’água –

       as frondes de pedra –

       lâmina de mármore, sobre lâmina,

       prata, aço sobre aço,

       bicos de prata erguendo-se e cruzando-se,

       proa ajustada contra proa,

       pedra, camada sobre camada,

       reflete o ouro a flama de uma noite”

Borso, Carmagnola, os artífice, i vitrei,

Para lá, certo tempo, tempo após tempo,

E as águas mais ricas do que vidro,

Ouro bronzeado, brasa sobre prata,

Potes de tinta à luz do archote,

O clarão de vagas sob proas,

E bicos de prata erguendo-se e cruzando-se.

    Árvores de pedra, alvo e rosalvo na treva,

Ciprestes pelas torres,

       Amontoados sob cascos, à noite.

 

                        “No florescer o ouro

Doura a aura ao seu redor.”...

 

Agora, indiferente na toca, sarça meio sobrearqueada,

Um olho para o mar, através da fresta,

Luz cinza com Atena.

Zotar e seus elefantes, o dourado tecido no lombo,

O sinistro, sacudido, sacudido.

       a sua legião de dançarinas.

E Aleta, pela curva da encosta,

           com os olhos voltados para o mar,

       e algas nas mãos,

Brilho salino com a escuma,

Koré pela campina luzente

      com poeira verde-cinza no relvado:

“Pelo momento, irmão de Circe.”

Braço debruçado em meu ombro,

Viu o sol três dias, o vulvo sol,

Como um leão erguido sobre areia lisa;

                                                               e naquele dia,

E por mais três e nenhum depois,

Esplendor, como o esplendor de Hermes,

E então saiu ao mar

                                para o lugar de pedra,

Branco pálido sobre água,

                                           água conhecida,

E a branca floresta de mármore, vergada ramo a ramo.

A fronte encurvada pela pedra,

Para lá foi Borso, quando lhe desfecharam a flecha farpada,

E Carmagnola, entre as duas colunas,

Sigismundo, depois do naufrágio na Dalmácia,

      Crepúsculo como o voo do gafanhoto.
 
 
(do livro "Os cantos", Tradução: José Lino Grünewald, Nova Fronteira)
 
 
 

 

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