terça-feira, 18 de junho de 2013

Rafael Zacca

A gesta de Diomedes



Perguntei à cidade:

-O que luta em teu domínio?


Respondeu-me, impassiva:

-Lutam os carros, pesadas carcaças

de metal e substancial fumaça

lutam as raízes das árvores

contra as calçadas como filhos

nascendo à revelia do desejo

de que não viessem

lutam as luzes em fachos

quase-fictícios, qual sonhos

arcaicos que reprimimos

da era nada longínqua

em que nos criamos

próximos das estrelas

lutam os travestis contra os imbecis

assim como lutam as botas nobre-e-caras

contra os canivetes escondidos nas bolsinhas

lutam os amantes, em diversas modalidades

da luta livre à capoeira, do boxe ao muay thai

e quem se distrai, ou baixa a guarda

acorda em uma cama de hospital

e lutam os pacientes do hospital

pelo soro da compaixão

lutam as aparelhagens contra a natureza implacável

caixas de metal contra o Sol

armações de alumínio contra a Chuva

antenas prateadas contra o Relâmpago

fones de ouvido contra o Homem.


Isto respondeu-me a cidade.

Para ela, então, armei-me.

Marcharam, amancebadas, contra mim

a Beleza e a Guerra.


A primeira feri no punho

para ver sangrar o róseo.

Dele bebi, e não o quis mais.

 
A segunda feri no peito.

E o seu grito pavoroso superava

o alarido dos homens amedrontados.


http://cancoesdeamoreguerra.tumblr.com


Rafael Zacca é poeta, crítico, e se mete com história e filosofia. Nasceu em 1987 e desde então vive indeciso no Meier. Mantém um laboratório online para uma história sem fatos do amor e da guerra.
 
 
 

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