Poema
Trouxe o sol à poesia,
mas como trazê-lo ao dia?
No papel mineral
qualquer geometria
fecunda a pura flora
que o pensamento cria.
Mas à floresta de gestos
que nos povoa o dia,
esse sol de palavra
é natureza fria.
Ora, no rosto que, grave,
riso súbito abria,
no andar decidido
que os longes media,
na calma segurança
de quem tudo sabia,
no contato das coisas
que apenas coisas via,
nova espécie de sol
eu, sem contar, descobria:
não a claridade imóvel
da praia ao meio-dia,
de aérea arquitetura,
ou de pura poesia:
mas o oculto calor
que as coisas todas cria.
1947
(do livro “O artista inconfessável”, Alfaguara)
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