I
dois galhos
em cima do banco de palha
lembram
as pernas de Sra. M
recortadas
(peteleco em castelo de
cartas)
apartam a visão de
seriados
ou novelas: pouco importa
a essa altura mal enxergava
o contorno diluído
das figuras
borrada de amarelo
era,
quem era?
separada do oásis, Sra. M
quer morrer
mandou me chamar
meu amor, arrume
uma tv maior, sim?
mas o plano de saúde
as enfermeiras, o plantão,
a máfia impessoal deles
tem mais poder
do que todas as máfias juntas
gerenciam a organização
sem ao certo saberem-se
parte de uma
vêm com tralhas
tubos, armados contra a morte
o golpe
delicadamente batizado de
home care
Life is good
mas todos os dias
desejo secretamente
ir com Sra. M
e se eles descobrirem?
não conte a ninguém
III
o slogan
Life is good descortina
a tipografia neutra
ao fundo negro
moçinhas, diz Sra. M
chegou a minha hora
Life is good
então elas ficam nervosas
se mexem muito na cadeira
engolidas pelo mantra
Life is good
ressoa
com uma voz robótica
Life is good
para as cinzas Sulamita
mas a noite chegou e os
bárbaros não vieram
murmuram que não há mais
bárbaros
nem zona fronteiriça
disque barbárie no 0800
ninguém atende por bárbaro
mas há cadastros, números,
diários de guerra
eles estão em toda a parte,
Sra. M
eu os vi uma vez
aqui entre nós.
Ana Salek nasceu no
Rio de Janeiro em 1987. Atualmente é bolsista no programa de mestrado em
Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio. Em 2010, publicou “Dezembro”,
um livro de poemas. Recentemente se juntou ao time de educadores do Projeto
Jovem Rocinha, onde dá aulas na Oficina da Palavra.
imagem por Mira Shendel
A vida e suas opções . Interessante poema . Parabéns à autora .
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