O que são meus versos
Se é vate quem acesa a fantasia
Tem de divina luz na chama eterna;
Se é vate quem do mundo o movimento
Co’o movimento das canções governa;
Doces, límpidas fontes de ternura,
Veladas por amor, onde se miram
As faces de querida formosura;
As paixões vivifica, excita o pasmo,
E da glória recebe sobre a arena
As palmas, que lhe of’rece o entusiasmo;
Do desgosto gelou fatal quebranto;
Que, de tanto gemer desfalecido,
Nem sequer movo os ecos com meu canto;
Envenenadas fontes d’agonia
Malditas por amor, a quem nem sombra
De amiga formosura o céu confia;
Só entregue a meu mal, quase em delírio,
Ator no palco estreito da desgraça,
Só espero a coroa do martírio;
Meus versos, pela dor só inspirados, –
Nem são versos – menti – são ais sentidos,
Às vezes, sem querer, d’alma exalados;
Por contínuas angústias comprimido;
São pedaços das nuvens, que m’encobrem
Do horizonte da vida o sol querido;
Aos pulsos a desgraça, ímpia, sanhuda;
São gotas do veneno corrosivo,
Que em pranto pelos olhos me transuda;
Do caminho que levam descuidada,
Qual, ludíbrio do vento, as secas folhas
Solta a esmo no ar planta mirrada.
(do livro "Poesia brasileira - Romantismo", organizadores: Valentim Facioli & Antonio Carlos Olivieiri, Editora Ática)
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