sexta-feira, 21 de março de 2014

Terceira parte - Álvares de Azevedo

Página rota

Et pourtant que le parfum d'un
pur amour est suave.
George Sand

Meu pobre coração que estremecias.
Suspira a desmaiar no peito meu:
Para enchê-lo de amor, tu bem sabias,
            Bastava um beijo teu!

Como o vale nas brisas se acalenta,
O triste coração no amor dormia;
Na saudade, na lua macilenta
            Sequioso ar bebia!

Se nos sonhos da noite se embalava
Sem um gemido, sem um ai sequer,
É que o leite da vida ele sonhava
            Num seio de mulher!

Se abriu tremendo os íntimos refolhos,
Se junto de teu seio ele tremia,
É que lia a ventura nos teus olhos,
            E que deles vivia!

Via o futuro em mágicos espelhos,
Tua bela visão o enfeitiçava,
Sonhava adormecer nos teus joelhos...
            Tanto enlevo sonhava!

Via nos sonhos dele a tua imagem
Que de beijos de amor o recendia:
E de noite nos hálitos da aragem
            Teu alento sentia!

Ó pálida mulher! se negra sina
Meu berço abandonado me embalou,
Não te rias da sede peregrina
            Dessa alma que te amou.

Que sonhava em teus lábios de ternura
Das noites do passado se esquecer;
Ter um leito suave de ventura...
            E amor... onde morrer!


(do livro "Lira dos vinte anos", Martin Claret)


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